segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Insônia

Quem me conhece bem sabe que dormir não é exatamente o meu forte. Pois bem, quarto dia seguido de sono leve aqui em Bangladesh. Hoje eu acordei ainda mais cedo do que nos outros dias. São 3:30 da manhã e despertei como se tivesse dormido 10 horas non-stop. Em uma hora eu estarei com sono novamente, mas lembrei de algumas coisas que eu não tinha registrado no post de ontem e que valem a pena ser divididas .... vamos lá ... afinal de contas, tenho uma estrada de 7 horas para dormir durante o dia hoje ...

Bangladesh tem 7 "estados", que eles chamam de "divisions":
  1. Barisal (বরিশাল Borishal)
  2. Chittagong (চট্টগ্রাম Chôţţogram)
  3. Dhaka (ঢাকা Đhaka)
  4. Khulna (খুলনা Khulna)
  5. Rajshahi (রাজশাহী Rajshahi)
  6. Sylhet (সিলেট Sileţ)
  7. Rangpur (রংপুর Rangpur)

As divisions são divididas em 64 "distritos". Os distritos são divididos em sub-distritos (mais de 400). Cada division, distrito e sub-distrito é comandado por níveis diferentes de políticos, que, segundo o Zachary, são eleitos pelo povo. Além dos políticos que comandam os distritos e outras subdivisões, Bangladesh tem um parlamento de 300 pessoas, também eleitas pelo povo, e um primeiro ministro eleito pelo membros do congresso.

As divisões, sub-divisões, eleições, regras e outras curiosidades locais não têm sido muito eficientes na governança desse país. A sensação que eu tenho depois de alguns dias nessa terra é que há mais ONGs e estrangeiros preocupados com esse lugar do que o próprio governo. Aliás, a sensação que dá é que o governo não faz o mínimo, ou nada, para melhorar a condição de vida das pessoas daqui.

Zachary me disse que quem ganha acima de 100 mil takas por ano aqui paga imposto. A primeira alíquota do imposto de renda é 10%. Como no Brasil, dependendo da renda anual, o cidadão paga uma alíquota maior. Parece que a alíquota mais alta é por volta de 30% (o Zachary não sabia ao certo). Não sei para onde vai o dinheiro desses impostos. De qualquer forma, não sei se alguém chega nos patamares para pagar imposto .... Mas, de novo, grande parte dessa gente não tem RG e o governo nem sabe quem eles são.

Iniciativas como as do Grameen Bank são bacanas, visionárias, impactantes, um sucesso, mas dos 150 milhões de pessoas que existem aqui (ainda não sei onde os ricos moram, até agora só vi muita miséria) ele consegue afetar a vida de 8 milhões.

Não me levem a mal. 8 milhões é incrível. É extraordinário. Mas existem algumas dezenas de milhões de pessoas esquecidas no meio do lixo e da pobreza. Eu sei, eu sei, tem a questão religiosa, cultural, política, histórica ... mas em 2010 não deveriam mais existir lugares como esse. O que é que eles, nós, todos, estiverem fazendo por esse povo, não é suficiente.  Segundo as minhas conhecidas ONGeiras, há alguns poucos países na África que são um pouquinho piores que aqui. Não consigo imaginar. Preciso viajar mais para o interior do Brasil para ter certeza que não impomos ao nosso povo condições semelhantes de vida que se observa aqui.

Bangladesh parece um universo paralelo ao nosso, no qual as pessoas vem tomando decisões erradas há tanto tempo, que a realidade que eles construíram nos últimos anos e se baseiam hoje é uma Matrix diferente da nossa. Não que a nossa seja perfeita, mas aqui falta o básico do entendimento sobre a vida.

Uma das preocupações do Grameen Bank ao emprestar dinheiro para as mulheres é "ensinar sobre a vida", para que elas possam ser saudáveis e possam educar seus filhos de uma forma saudável. Quem entra para a família do Grameen Bank tem que obedecer 16 regras aqui em Bangladesh. Algumas regras de que me lembro são as seguintes:

  • prometo manter minha casa limpa
  • prometo ter uma "latrina" que dê o mínimo de higiene para minha família
  • prometo colocar meus filhos na escola
  • prometo não vender minhas filhas em casamento e aceitar dotes em troca de filhas mulheres
  • prometo cuidar do meu vizinho
  • prometo ajudar os membros do Grameen Bank quando eles estiverem em dificuldade
  • prometo ferver água antes de beber
  • prometo plantar sementes na época adequada da lavoura
Ver o que aquelas mulheres da aldeia que eu visitei ontem conquistaram, nesse ambiente completamente insano, é chocante. A alegria e o sorriso delas, não sei de onde elas tiram vida para isso.

Vou voltar para a cama.

p.s. o intérprete me ligou ontem de noite para dizer que conseguiu um número de telefone bengali para mim! Assim, apesar de estar sem conexão de internet nos próximos dias, terei uma forma para me comunicar com os meus queridos aí no Brasil

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