segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Dhakuli Manikgonj Branch

Saí do hotel hoje às 6:45 da manhã. O Kamal estava me esperando com um sorriso no rosto (imaginando como ele iria gastar as 1.400 takas que ganharia hoje, com a minha ida e volta do banco).

Na porta do hotel conheci por acidente duas gringas (uma do Canadá e uma da Austrália) que estavam indo para o Grameen. Ofereci carona. Elas toparam. Fomos os 4 para o outro lado da cidade, todo mundo mudo. Eu, com sono, as gringas com vergonha de mim, o Kamal não fala inglês e ainda era muito cedo para o telefone dele tocar. O som ambiente era formado apenas pelas buzinadas do Kamal e dos poucos carros que estavam nas ruas.

Primeira surpresa: não tinha trânsito. Aqui em Dhaka o rush hour é entre 9:30 e 11:30 da manhã. Também não entendi. O pessoal começa a trabalhar tarde (e param cedo, para ser sincera). Chegamos em 20 minutos no Grameen. Detalhe: o mesmo percurso ontem me levou mais de uma hora pela manhã e quase hora e meia no final do dia.

Segunda surpresa: as duas gringas estavam no meu programa do dia. Embarcamos as 3, o Zachary e um motorista doido para uma branch do Grameen que fica em Manikgonj Zone (60 km de Dhaka). Como estavam todos silenciosos no carro, só descobrimos o destino comum ao embarcar na van do Zachary. Uma chama Tracy e a outra eu não gravei. Também não sei até agora qual é a mulher do Canadá e qual é a Australiana. O pior é que as duas trabalham em ONGs pelo mundo e contam histórias parecidas. Não são casadas, não têm filhos, são loiras e têm olhos azuis. Não consegui registrar nenhuma das duas de forma independente. Para mim, elas são as ONGeiras gringas, que já moraram em mais de 50 países (é o que elas dizem).

Eu achei que tinha entendido o que era trânsito caótico nos últimos dias, mas tudo o que eu tinha vivido até agora não se compara com a experiência de viajar em uma estrada de Bangladesh. As pistas são simples e vejo carros, caminhões, ônibus, animais, gente e lixo em todas as direções. Não há uma mão da ida e uma mão de volta. Existe apenas o trecho do asfalto e tudo e todos andam em todos os espaços disponíveis da estrada, literalmente desviando um do outro. As placas no caminho são chocantes (traduções literais - não consegui tirar fotos):

"Reduza a velocidade para não matar vidas"
"Use a pista da esquerda de preferência"
"Não mate nas estradas"

Todos buzinam, se xingam, entram no caminho uns dos outros, ultrapassam por todos os lados e usam o acostamento como a mão que lhe for mais conveniente no momento.

Pergunto ao Zachary:

"Qual a idade mínima para tirar a carta aqui em Bangladesh?"

"18 anos", ele responde.

"E vocês precisam fazer uma prova para tirar a carta"?

"Claro", ele responde.

"E todos fazem a prova e tiram carteira de motorista antes de dirigir na estrada"?

"Ah .... isso não. Uma coisa é o que a lei diz. Outra coisa é o que as pessoas fazem, Marina. Aqui a maioria das pessoas tem carteira de motorista falsificada. Se a polícia para, eles pagam um café e são liberados".

O Zachary me respondeu isso com a maior tranquilidade do mundo. As gringas e eu nos olhamos e ficamos mudas. Mais um pouco.

Depois de mais de duas horas na estrada, percorremos os tais 60 km e chegamos no nosso destino.

Conversamos com o pessoal do Grameen que trabalha no vilarejo e em seguinda fomos a uma reunião de mulheres (todas as clientes do Grameen encontram-se todas as semanas para contar o que fizeram com o dinheiro emprestado pelo Grameen até então, para pagar o juro do empréstimo devido naquela semana, para fazer o depósito da poupança compulsória e para solicitar novos financiamentos, quando for o caso). Não se preocupem que ainda vou dedicar um capítulo inteiro do blog para contar os detalhes da metodologia Grameen Bank....  

Enfim, passei o dia no vilarejo escutando histórias das mulheres que tomam empréstimo com o Yunus há mais de 10 anos. Uma delas pegou o seu primeiro empréstimo há 18 anos. Hoje tem 3 casas, 2 filhos na faculdade, alguns hoteis na redondeza e diz que, depois que começou a ganhar dinheiro, é respeitada pelo marido, pelos filhos, pelos vizinhos e pelas amigas. Fui na casa de várias delas, conheci os maridos (todos orgulhosos das esposas), os filhos, tirei fotos feito uma maluca, ganhei 3 frutas locais (parecem um pequeno coco) e visitei um gerador de energia caseiro, que funciona com esterco de vaca (incrível) (?!). As mulheres têm histórias diferentes, resultados diferentes, dramas diferentes, mas todas são impressionantemente sorridentes, amáveis, fortes e otimistas. Ainda estou meio passada com o dia de hoje e em outro momento conterei mais detalhes sobre elas.

A volta para Dhaka foi tão emocianante quanto à ida. Fiz reuniões com o time da administração até o final do dia e o Kamal foi me buscar às 5:30 da tarde. Fiquei uma hora e meia no trânsito. Estou exausta. Preciso arrumar minha mala. Amanhã vou para um lugar que fica bem longe daqui: 7 horas de viagem. Ficarei uma semana morando nesse vilarejo que fica em Rajshahi. Vejam no mapa, é incrivelmente longe de Dhaka ...! Lá não tem luz, não tem internet e, segundo o Zachary, não tem malária ou "dengue fever".

"Mas leva o repelente Marina, just in case". Sei ...

Ainda não sei porque eu topei ir para esse "acampamento bengale". Afinal de contas, já estou no maior acampamento de todos. Mas o pessoal do Grameen insistiu, disse que eu preciso ir até lá para entender a filosofia do Yunus ... então, aqui estou eu, me apressando para acabar o relato de hoje, pois ainda preciso arrumar muita coisa antes de viajar.

Vou deixar a maioria das minhas coisas no hotel. Kamal vem me buscar às 7 da manhã. Meu ônibus sai às 8:30. O intérprete vai junto.

Não sei se vou conseguir mandar notícias de Rajshahi. Se eu não atualizar o blog (por impossibilidade tecnológica), volto na semana que vem com as fotos e novidades dos próximos dias.


chegando no vilarejo

Fotos do dia de hoje seguem no próximo post!


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