Meeting Professor Yunus

Qual a probabilidade da brasileira que vai para Bangladesh, ficar com jet lag por quase duas semanas, acordar sem alarme todos os dias entre 5 e 6 da manhã, e justamente no dia em que ela precisa acordar às 6:45, o hotel esquece de ligar para ela no horário combinado (sendo que ela não tinha ligado o alarme do celular no dia anterior porque o celular pifou)?

Qual a chance de o motorista bengali, que nunca fura com seus compromissos, e sempre, até então, chega 15 minutos antes do horário (eu também sempre adiantada para testemunhar a pontualidade do moço, com a minha conhecida neurose de horário) furar nesse dia? E o hotel demorar mais 15 minutos para achar um substituto?

Qual a chance do trânsito de Dhaka estar mais catastrófico do que o normal nessa mesma data, pois hoje é o último dia útil da semana aqui e, como toda sexta feira no Brasil, o trânsito fica um tiquinho pior?

Qual a chance de mesmo assim eu chegar apenas 15 minutos atrasada para a reunião das 8:30, completamente esbaforida e com calor, de blazer branco, com uma roupa um pouco mais decente do que a média que eu uso aqui, pois na tarde desse mesmo fatídico dia eu tenho uma reunião importante e preciso estar minimamente apresentável (apesar das mãos vermelhas de mehedi)?

Qual a chance de nesse mesmo dia o seu coordenador de treinamento resolver ir visitar uma favela, no meio da manhã, no calor de 40 graus, no meio do trânsito e da poluição, de rickshaw, banco imundo e quebrado, que suja o blazer branco imediatamente, aventura essa que leva cerca de 30 minutos na ida e 30 minutos na volta para terminar (sem contar a meia hora que passei na sede de uma ONG parceira do Grameen, que fica dentro da favela)?

Qual a probabilidade de a reunião que você tem na volta do passeio assustador de rickshaw, então marcada para as 12 horas, ser cancelada e remarcada para a segunda feira seguinte?

Qual a probabilidade de, por conta da correria, você esquecer o seu lap top nesse dia, não ter acesso a internet no Grameen, e esquecer a sua garrafa de água potável no hotel?

Quem acharia que nessa hora a Jannat, Managing Director do Grameen (a quarta pessoa mais importante da organização), que foi super com a sua cara desde o início do programa, te convidaria para almoçar com ela e em seguida ofereceria seu computador para você usar à vontade, com acesso à internet, pois ela é da diretoria, enquanto você aguarda a tal fatídica reunião começar?

Qual a chance de nesse momento eu começar a pirar de que o dia de hoje todo começou torto e provavelmente a minha reunião da tarde, a tal reunião importante, também vai ser cancelada, e começar a pensar em como eu devo preencher a minha tarde, de roupa branca suja, sem água, e com fome? 

Pois é. Esse foi o dia em que eu conheci pessoalmente o Professor Yunus. Apesar de todas as baixas da manhã, às 3:05 da tarde de hoje, 11 de novembro de 2010, eu estava entrando na sala dele, para uma reunião que terminou pouco antes das 5.

"Hi Marina. It is so nice to finally meet you! So, this is the big lawyer from Brazil! I am surprised, I was expecting a big, old, lady. I can not believe that this is you!" (tomei como elogio, certo?!)

Foram com essas exatas palavras que o Professor Yunus me recebeu. Com um caloroso abraço, um sorriso no rosto, um monte de perguntas, em seguida me convidando para sentar na sua mesa redonda de reunião. 

O Professor Latifee,  Jannat e o Tamim entraram, jogamos conversa fora por alguns minutos. A Jannat se retirou em seguida e começamos a reunião. 

A minha viagem para Bangladesh começou pelos motivos que eu expliquei no primeiro capítulo desse blog, mas no meio do caminho, quando eu já estava programada para vir para cá, felizes coincidências e conquistas aconteceram, que me colocaram em contato com um time do Grameen Bank, interessado em montar uma filial no Brasil. Essa história é muito longa e não acho que vale a pena contar agora, mas o resumo de tudo isso é que uma das minhas missões aqui em Bangla era finalizar os termos e condições da abertura do Grameen Bank no Brasil, cujas discussões com o Professor Latifee e um parceiro local do Grameen (ainda não estou autorizada a divulgar o seu nome) já estavam adiantadas, mas precisávamos do ok final do Professor Yunus.

No final da deliciosa reunião, enquanto se despedia de mim, o Professor Yunus mandou os seguintes recados:

"Marina, diga aos seus leitores - contei a ele do blog, ele adorou - que eu mandei um "ALÔ" para todos".

"Professor Yunus, então posso dizer a eles que conheci o senhor e que o Grameen está definitivamente entrando no Brasil?"

"Sim, claro! Diga mais, diga a eles que é você quem está fazendo isso" ...."E fale para o seu marido, Felipe, que na próxima vez que você vier a Bangladesh, ele deve vir junto, vamos marcar de almoçar".

Finalmente, ele falou: "Você ainda tem bastante tempo conosco aqui ... passe na minha sala sempre que quiser. Quero conversar mais".

Agora o meu recado:

• a todo o pessoal do escritório, que me ajudou nos meses desse ano, fazendo pesquisas, preparando memorandos, participando de reuniões e almoços, saibam que todos os documentos do Mattos Filho estavam nas mãos do assistente do Professor Yunus, o Tamim, que tinha feito anotações em todos eles. GOOD JOB!;
• os próximos dias meus aqui, até eu ir para a Índia, vão ser de trabalho, reuniões e discussões sobre o projeto Brasil;
• quando eu voltar para São Paulo, tem muita coisa para fazer, e o Professor Yunus disse que está com pressa;
• obrigada aos meus sócios que concordaram que eu viesse atrás dessa oportunidade e me apoiaram na iniciativa, pessoalmente, e institucionalmente;
• Mattos Filho está oficialmente contratado pelo Professor Yunus, como o escritório de advocacia do Grameen Bank no Brasil, dentro do nosso programa de PRO BONO.

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